30 de dez. de 2009

2010

Tô relendo minha lida, minha alma, meus amores
Tô revendo minha vida, minha luta, meus valores
Refazendo minhas forças, minha fonte, meus favores
Tô regando minhas folhas, minhas faces, minhas flores
Tô limpando minha casa, minha cama, meu quartinho
Tô soprando minha brasa, minha brisa, meu anjinho
Tô bebendo minhas culpas, meu veneno, meu vinho
Escrevendo minhas cartas, meu começo, meu caminho
Estou podando meu jardim
Estou cuidando de mim

(Vander Lee - Meu Jardim)

13 de dez. de 2009

Dos cansaços e perdas



Peço por favor
Se alguém de longe me escutar
Que venha aqui pra me buscar
Me leve para passear

No seu disco voador
Como um enorme carrossel
Atravessando o azul do céu
Até pousar no meu quintal

Se o pensamento duvidar
Todos os meus poros vão dizer
Estou pronto para embarcar
Sem me preocupar e sem temer

Vem me levar
Para um lugar
Longe daqui
Livre para navegar
No espaço sideral
Porque sei que sou

Semelhante de você
Diferente de você
Passageiro de você
À espera de você

No seu balão de são joão
Que caia bem na minha mão
Ou numa pipa de papel
Me leve para além do céu

Se o coração disparar
Quando eu levantar os pés do chão
A imensidão vai me abraçar
E acalmar a minha pulsação

Longe de mim
Solto no ar
Dentro do amor
Livre para navegar
Indo para onde for
O seu disco voador

(Contato Imediato - Arnaldo Antunes)

9 de dez. de 2009

Da espera e parte de mim


"Me enobrece, porque me tornou poderosa.
Capaz de prosseguir com essa invenção chamada humanidade." (Elisa Lucinda)


26 de nov. de 2009

Do endurecimento

"Carcará, lá no sertão
é um bicho que avoa
que nem avião.
É um pássaro malvado,
tem o bico volteado
que nem gavião
Carcará pega, mata e come..."


A vida endurece a gente. A essência às vezes se mantém, mas não há nada de mais terrível que a bondade. Ela consome, engana, enlaça, esgana. Não há de ser puro, nem bom... não há de ser bobo. Bondade destrói, apaga, fere, sangra. Bondade é cruel. Hoje trago uma arma sem sorrisos apontada pras ameaças e atiro desprezo a qualquer movimento. Trago gosto de carne entre os dentes e não sepulto cadáveres de sonhos. Mastigo ilusões e espezinho esperanças. Desprezo profundamente os bons, os caridosos e os felizes. Nada mais prejudicial ao mundo do que esssa espécie altamente egoísta. Esses tolos não sabem que sua bondade, caridade e felicidade implicam na maldade, egoísmo e tristeza de alguns. É a lei do equilíbrio na coexistência. Luto, cavo, enlaço, sufoco, torço, corro, aguento, esfrego, amasso, seco, passo, xingo, sofro e mato. Nada me enoja mais do que os brandos e pacíficos. A vida é guerra, sangue sangrado, subtraído, chorado. A vida é caça, há de se lutar para não ser caçado. Que fique a bondade no outro mundo onde estão as coisas bonitas e belas, neste não há espaço, há somente instinto.

Se o meu mundo não fosse humano,
também haveria lugar para mim:
eu seria uma mancha difusa de instintos,
doçuras e ferocidades, uma trêmula irradiação de paz e luta:
se o mundo não fosse humano eu me arranjaria sendo um bicho.
Por um instante então desprezo o lado humano da vida
e experimento a silenciosa alma da vida animal.
É bom, é verdadeiro, ela é a semente do que depois se torna humano.
(Clarice Lispector)

23 de nov. de 2009

O amor é filme e Deus espectador


Tenho amado tanto. E só a ele, que continua acendendo tudo dentro de mim. Só ele que me alegro em ver que está ali ao meu lado sempre que acordo. Só ele que me faz rir, que quando me toca faz o mundo parar. E ele que é dono do meu amor, é com quem eu divido tudo, até minha alma. Se eu não o tivesse encontrado agora seria só silêncio, da boca ao coração.


Pretrópolis 20/11/2009


16 de nov. de 2009

Num doce tom de violeta

Não que estivesse triste,só não sentia mais nada
as pessoas falam coisas, e por trás do que falam há o que sentem, e por trás do que sentem há o que são e nem sempre se mostra.
A cada dia, viver me esmaga com mais força.
A única magia que existe é estarmos vivos e não entendermos nada disso.A única magia que existe é a nossa incompreensão.
Mas sempre me pergunto por que, raios, a gente tem que partir. Voltar, depois, quase impossível
Mudei muito, e não preciso que acreditem na minha mudança para que eu tenha mudado
E, de qualquer forma, às cegas, às tontas, tenho feito o que acredito, do jeito talvez torto que sei fazer
Sabe, eu me perguntava até que ponto você era aquilo que eu via em você ou apenas aquilo que eu queria ver em você, eu queria saber até que ponto você não era apenas uma projeção daquilo que eu sentia, e se era assim, até quando eu conseguiria ver em você todas essas coisas que me fascinavam e que no fundo, sempre no fundo, talvez nem fossem suas, mas minhas, e pensava que amar era só conseguir ver
tudo já passou e minha vida não passa de um ontem não resolvido, bom isso. E idiota. E inútil.
A verdade é que todos vão te machucar, você é quem deve decidir por quem vale a pena sofrer
não me venha com essa história de atraiçoamos-todos-os-nossos-ideais, nunca tive porra de ideal nenhum, só queria era salvar a minha, ,veja só que coisa mais individualista elitista, capitalista, só queria ser feliz, cara(...)
as pessoas suportam tudo, as pessoas às vezes procuram exatamente o que será capaz de doer ainda mais fundo
Mas a mim não importava o que se fora, queria o passo à frente...
(Caio Fernando Abreu)

11 de nov. de 2009

Do povo

Um café? Não obrigado.
Tudo flui, menos minha alma
Tudo gira, menos o meu mundo
Nascemos para engolir bosta, restos, extrumes
Para alimentar bons costumes
que não se aplicam à ninguém.

(Dani Zamorano)

* Poema inacabado pro povo que não é de "Manuel Carlos", poema inacabado pra gente.

10 de nov. de 2009

Do inominável


há coisas que não tem nome e nem precisam dele pra existir. puramente são e deixam de ser quando precisam deixar de existir. deixar de ser também é necessidade.



Onde agora? Quando agora? Quem agora? Sem me perguntar. Dizer eu. Sem pensar. Chamar isso de perguntas, de hipóteses. Ir em frente, chamar isso de ir, chamar isso de em frente. É possível que, um dia, o primeiro passo dado, eu simplesmente pare, ou, em vez de sair, segundo um velho hábito, passar dia e noite o mais longe possível de onde eu moro, não era longe. Isso pôde começar assim. Não mais me colocarei questões. Acredita-se apenas repousar, a fim de agir melhor em seguida, ou sem pensamentos rasteiros, e eis que em muito pouco tempo se pega na impossibilidade de jamais voltar a fazer coisa alguma. Pouco importa como isso se dá. Isso, dizer isso, sem saber o quê. Talvez eu não tenha feito senão inteirar um velho estado das coisas. Mas eu não fiz nada. Ostento ares de falar, não sou eu, de mim, não é de mim. Algumas dessas generalizações para começar. Como fazer, como eu vou fazer, o que eu vou fazer, na situação em que me encontro, como proceder? Por pura aporia ou melhor por afirmações e negações anuladas a torto e a direito, ou cedo ou tarde. Isso de modo geral. Deve haver outros vieses. Senão seria de se desesperar de todo. Mas é de se desesperar de todo. A reparar, antes de ir mais longe, em frente, que digo aporia sem saber o que isto quer dizer. É possível ser efético de modo que não à revelia? Eu não sei. Os sins e nãos, é outra coisa, eles me retornarão à medida que eu progredir, e o modo discreto de tirar do sério, cedo ou tarde, como um pássaro, sem esquecer um só. Diz-se isto. O fato parece ser, se na situação em que me encontro posso falar de fatos, não somente que eu vou ter de falar de coisas de que eu não posso falar, mas ainda, o que é mais interessante, que eu, eu não sei mais, não dá em nada. Não obstante, sou obrigado a falar. Não me calarei jamais. Jamais. (Beckett - O Inominável)

6 de nov. de 2009

Do Abreu

"Está tudo planejado:
se amanhã o dia for cinzento,
se houver chuva
se houver vento,
ou se eu estiver cansado
dessa antiga melancolia
cinza fria
sobre as coisas
conhecidas pela casa
a mesa posta
e gasta
está tudo planejado
apago as luzes, no escuro
e abro o gás
de-fi-ni-ti-va-men-te
ou então
visto minhas calças vermelhas
e procuro uma festa
onde possa dançar rock
até cair"
(Supostamente de Caio Fernando Abreu)

3 de nov. de 2009

Das trocas

"Hoje eu te ajudo, amanhã você me ajuda. A vida é uma troca."

(frase da vizinha quando o peso das sacolas era enorme e o calor me torrava a pele)

27 de out. de 2009

Metamorfosear

METAMORFOSE É AR.

Definitivamente tenho vocação para o denso, o melancólico. Não é questão de preferência, é questão de talento.

Do ineditismo (ou não inedistismo) :

Ela sentou, pousou sobre o colo a camisa que era dele. Apanhou a pena, molhou na tinta. Gesto corriqueiro e que lembrava a saliva dele molhando outras bocas. O coração batia ritmado, surgia um embrulho no estômago típico dos mal amados. A pena pesava. Ela preparou o papel, como quem prepara o bisturi pra se abrir. Tentou cuspir as palavras, mas não conseguia. Dentro dela era um rastro de sonho e de dor que compunham uma melancolia bonita. As luzes do lampião tilintavam, frágeis como era a certeza dela sobre o amor dele. A tinta nada riscava, o desespero crescia. Ela respirava ofegante, sonhava, lembrava e a luz tremia. Se não fosse a luz trêmula seria escuridão. A luz trêmula embraçava seus olhos, mas era melhor do que a escuridão. A luz uma hora se apaga. Ela sempre soube disso... O dia vem e a o lampião se apaga, e é dia. Absolvição. O papel parado imóvel, como a esperar coisas dela. Ela podia fazer como ele, reescrever coisas, redizer e ressentir. Mas não conseguia. Era dele, portanto não podia reescrever ou ressentir. A pena pesava. Ela cansou de tentar se desaguar sobre o papel. Foi então que um vazio infinito a invadiu. Um vazio de existência. Da existência forçada de viver o que é previsto. Achou tudo óbvio. Virou a cabeça pro infinito e sentiu dor. A dor da repetição. A pena já repousava no papel intocado. E ela chorou. Chorou por ela e por ele. Por se sentir como a existência, óbvia e apenas reconhecida, relida, reamada. Ouviu passos no andar de baixo que acompanhavam as batidas do seu coração e chorou. Como quem chora pra se lavar. Como quem sabe que tudo é repetição. Como quem chora de decepção. Como quem tem esperança de ser diferente, mas no fundo, bem no fundo sabe, ou desconfia que até ela era repetição.

* se rearmando para desamar


10 de out. de 2009

Lembrar

De na próxima vida se apaixonar e casar com um homem ou mulher sem filhos, pensão e ex-mulher/marido.

9 de out. de 2009

Manifesto Antipsicológico



Não me dêem explicações
que não sejam líricas ou transcendentais.
Não quero ninguém metendo o nariz
na ferida da minha memória.

Não quero decifrar fantasmas
e serei grata se permanecerem acorrentados.
Se o seu dedo está sujo de ciência,
tire as mãos da minha alma romântica.

Santidade ou masoquismo?
Não tente me extorquir intenções secretas.
E, por favor, não me tente entender
para além de minhas palavras.

Não me cobrem explicações
que não sejam líricas ou transcendentais.
Não quero ninguém metendo o nariz
na intimidade da minha neurose.

(Maria Isabel Borja)

8 de out. de 2009

Do cotidiano

Preciso de um diário de papel, preciso sentir mais matéria prima (ainda tem hífen?). Vou comprar um. Mas sei que vai cansar minha mãeo mais do que digitar. E terá um cadeado, porque às vezes inibe quando você lembra que vão ler o que você escreve. É um prazer exibicionista escrever para lerem. Acho minha escrita uma merda, mas acho boa (indagação). Me reveso entre a faxina da casa, que nunca se mantém limpa, a louça do almoço, os textos pra adaptar e a preguiça de fazer dieta; tudo isso com um dia chuvoso. Li uns textos de uma amiga ontem, achei ótimo, mas, ela também tem vergonha de mostrar. Ando insegura e não adianta dizer "segura na mão de Deus" que a coisa não passa. Tem umas questõezinhas antigas que não tô com paciência pra tocar nelas. Ontem entrei no ônibus e havia um menio de rua sentado logo depois da roleta com a cara retalhada. Era um retalho grande, mas grande mesmo que cruzava um olho de cima à a baixo com linhas grossas e pretas. Tinha uma coisa de sangue pisado, ainda rubro. Ficou um rasgo em mim de ver o rasgo. Mas não era só uma rasgo de cara, devia ser também um rasgo de alma. Confesso com um pouco de vergonha que passei ao lado do menino com rasgo segurando a bolsa pelo corredor do ônibus com medo de que ele pegasse. Mais ou menos como quando passo perto de um gato e sempre acho que ele agilmente vai me atacar (daí não adianta segurar a bolsa). Eu tenho esses medos bobos. Ando com vários deles. Quase os mesmos de sempre, mas alguns novos. É, são medos bobos... minha avó se soubesse de algum deles diria: - Pára de besteira menina! Fica pensando bobagem, eu hein! Acho que não terei minha avó por muito mais tempo pra minimizar meus medos. Isso me dá muito medo e dói. Dói de pensar. Tem coisa que a gente sente só de pensar. O pensamento invade e vira tátil, ganha corpo e com o corpo de pensamento toca nosso próprio corpo. Pensamento é corpo criado por nós. O pensamento dos outros nem sempre toca a gente, mas o nosso próprio... Nosso próprio? Tá certo isso? Fica o rasgo na minha cabeça, metaforicamente falando (Deus me livvre!), assim como "dar a alma para ter os olhos" no e-mail. Tem coisa que fica mesmo quando a gente não quer. Acho que nesta tarde estou numa infatilidade tão sábia. Não quero parar de escrever. Acho que vou pegar um cachorro. Mas transar com meu marido com um cachorro em casa deve ser constrangedor. Acho que vou perder a liberdade sexual se pegar um cachorro, vou me sentir tolida (é com lh?). Melhor não, não agora. Penso em passado às vezes. Não de querer voltar, mas de pensar só de pensar. Em todo tipo de passado. Principalmente na infância. Dá saudade, aquela saudade boa. Acho que escrevo pra aliviar os pensamentos, deixar os corpos de pensamentos de medo bem fraquinhos pra que não possam me tocar.

14 de ago. de 2009

Do interno de mim


O pavoroso e atroz mal de trazer tantas almas a rir dentro da minha...
(Loucura - Florbela Espanca)




23 de jul. de 2009

Do casamento


É maravilhoso estar unido a quem tanto se ama. Os dias tem outro sentido. Um sentido muito melhor, nunca imaginado. O amo mais que poderia minha alma supor. Anseio por um filho pra enfeitar a nossa vida. Somos uma família, de dois, às vezes de três, às vezes de quatro. Existem risos, algumas discordâncias, muitas brincadeiras, cosquinhas, abraços, beijos, gemidos, felicidade, harmonia e fidelidade, mas fidelidade de sentimento, de opção, não de conveniência. As paredes respiram amor. E nós? Nós? Uma lampadinha louca por um motoqueiro.

Sentia um acréscimo de estima por si mesma, E parecia-lhe que entrava enfim Numa existência superiormente interessante Onde cada hora tinha o seu encanto diferente Cada passo conduzia a um êxtase E a alma se cobria de um luxo radioso de sensações


11 de jul. de 2009

Do mau gênio

a abdicação em que consiste viver me machuca.





14 de jun. de 2009

Das dores das amigas

Essa eterna sacanagem do sexo masculino para com minhas amigas do sexo feminino é algo que me irrita profundamente. E por favor, não venham me dizer que é feminismo, sou esclarecida demais pra isso. A questão é que, em se tratando de fuder com a vida alheia com atitudes loucas, os homens vêm ganhado em disparada. Pra ser uma pessoa ponderada poderia até pesar, tentar entender os motivos que levam esses seres estranhos com peles penduradas no meio das pernas a fazerem umas coisas sem lógica nenhuma e passando completamente por cima dos sentimentos das minhas amigas. Que de santas podem ter apenas os cabelos compridos, mas que realmente se entregam a essas criaturas estranhas. Enfim, partidária ou não, não é a toa que seguinte frase é dita a séculos antes de eu nascer: homens não prestam. Que as fêmeas recolham suas cinzas, cicatrizem suas feridas, sacudam as mágoas e medos, coloquem seu melhor decote, lustrem seus lábios, reinaugurem suas vaginas, enalteçam seus trabalhos e metas, e aprendam a recomeçar, pra amar estes trastes que foram projetados exclusivamente pra nos magoar, mas que paradoxalmente dão sentido à nossas vidas. Para esquecer um traste, só arrumando um menos traste.

ela quer viver sozinha
sem a sua companhia
e você ainda quer essa mulher

ela goza com o sabonete
não precisa de você
ela goza com a mão
não precisa do seu pau

ela quer viver sozinha
sem a sua companhia
e você ainda quer essa mulher

que não sente a sua falta
e quando você chega em casa
ela não sente a sua presença
ela tem um travesseiro mais macio
do que o seu braço
e um acolchoado muito mais quente
que o seu abraço

ela quer viver sozinha
sem a sua companhia
e você ainda quer essa mulher
(Arnaldo Antunes)

4 de jun. de 2009

Do cachecol vermelho

Ontem passei o dia todo querendo escrever esse post. Ontem era poderosa, muito poderosa. Uma segunda pele preta que não protegeu em nada do frio, botas com fivela, vestido preto, cachecol vermelho e óculos escuros. Me sentia uma vilã ou espiã saída de uma novela brasileira do sbt, só faltava um carro. Ontem podia tudo. Circulei pelo rio pra cima e pra baixo, de trem, metrô e ônibus. Era poderosa mesmo sem carro. Eu podia tudo, via que tinha força e beleza. O cachecol vermelho me deu o poder. Encabecei uma reunião e um projeto, por mais absurdo que pareça. Li um livro bom em todos os trajetos, me senti uma Amelie Poulain nos metrôs da Europa no trem Central-Bangu. Bon soir, bon soir...

"eu seguro a minha língua como um garanhão, pela rédea, para que ele não se jogue sobre a égua, porque se eu largasse a rédea, se eu afrouxasse ligeiramente a pressão de meus dedos e a tração de meus braços, as minhas palavras a mim mesmo desmontariam e se arremessariam para o horizonte com a violência de um cavalo árabe que fareja o deserto e que nada mais pode frear."
(Bernard-Marie Koltès)

29 de mai. de 2009

Desobstrução

às vezes há necessidade de se desobstruir.
abrir os poros.
assassinar o que é ruim (em termos internos, claro).
rever o que é bom, e se permitido, reviver.
desobstruir o riso, o suspiro e o brilho dos olhos.

E ele deve ter pensando sobre ela: "E tudo que eu andava fazendo e sendo eu não queria que ela visse nem soubesse, mas depois de pensar isso me deu um desgosto porque fui percebendo (...) que talvez eu não quisesse que ela soubesse que eu era eu, e eu era."

Como eu quero que seja: "Quando partiu, levava as mãos no bolso, a cabeça erguida. Não olhava para trás, porque olhar para trás era uma maneira de ficar num pedaço qualquer para partir incompleto, ficado em meio para trás. Não olhava, pois, e, pois não ficava. Completo, partiu."

Falo tanto de desobstrução, mas está difícil desobstruir. Me esforço mas a história do sonho ainda roça nos meus calcanhares. Não por sentimento, mas por uma dependência desesperada que sei bem do que se trata. Há pensamentos soltos cá dentro, mistura de emoções remanescentes e novas emoções. Pairam muitas dúvidas e poucas certezas. Pairam poucas dúvidas e muitas certezas. Ouço Beirut, escrevo num processo que fica pouco a pouco selvagem no sentido literário e emocional. Morro de medo ainda. Mas sei que sei perder. Ao menos sabia. Me julgo forte, mas cansada. Me julgo cansada, mas forte. Não me julgo nada. Acho que acabei e não sei. Falta só bebida. Lembro agora que sonhei com armas de fogo. Minha mãe estava no sonho e pivetes tentavam me pegar, eu tirava de alguns deles algumas armas e munição, e tinha certeza que atiraria pra me defender. Minha mãe aparecia, pegava trêmula uma pistola, com uma munição incerta e conseguia atirar. Saíamos do cúbiculo pra fugir, tomávamos coragem e atirávamos. Sei que é típico dos peseudo-boêmios solicitar bebida pra escrever. Sou uma pseudo-boemia. Eu via sangue voar, tinha no final uma estação de trem. Eu e ela atirávamos, ela mais do que eu, eu tinha dificuldade em atirar, e me faltava coragem. Confesso que sou uma pseudo-várias-coisas, me confesso pra mim. Os convites não chegam. A psicologia explica o sonho, aliás nem precisa chamar ela aqui, eu mesma me explico. Eu tenho me machucado. Posso começar a me salvar. Beirut é bom. Tenho uma casa agora. Amo muito um homem. As unhas ficaram tão sujas! Tento desobstruir. Como sempre há excesso de informações e sentimentos em mim. Talvez porque eu seja vazia e sobre espaço. Talvez eu não seja vazia e falte espaço. Talvez eu não seja. Não entendo o sentido das coisas. Do sentido não entendo as coisas. As palavras giram aqui em volta. O medo corre atrás delas. Tento desobstruir, e agora entendo que mais que o medo é o amor que roça meus calcanhares. Existem reticências em volta, dentro, acima e abaixo de mim. Há uma pistola e balas, eu engatilho mas tenho medo de atirar. Sou toda amor e reticências. Será que sou?

"Acho que sou bastante forte para sair de todas as situações em que entrei, embora tenha sido suficientemente fraco para entrar."

"Ando meio fatigado de procuras inúteis e sedes afetivas insaciáveis."

*frases Caio Fernando Abreu

24 de mai. de 2009

Da abdicação

AR/TE FAZ RESPIRAR?
ACHO QUE NÃO MAIS.

Pairando do esgotamento mental a ausência de flúidos criativos e artísticos para o momento. Auto-consciência de incapacidade teatral para muitos fins. Desistência próxima, previsível e desejável.

Cego (Arnaldo Antunes)

Estou cego a todas as músicas,
Não ouvi mais o cantar da musa.
A dúvida cobriu a minha vida
Como o peito que me cobre a blusa.
Já a mim nenhuma cena soa
Nem o céu se me desabotoa.
A dúvida cobriu a minha vida
Como a língua cobre de saliva
Cada dente que sai da gengiva.
A dúvida cobriu a minha vida
Como o sangue cobre a carne crua,
Como a pele cobre a carne viva,
Como a roupa cobre a pele nua.
Estou cego a todas as músicas.
E se eu canto é como um som que sua.

23 de mai. de 2009

Do sentido

Absolutamente N
I
I
L
I
S
T
A


17 de mai. de 2009

Do não esquecimento


É Preciso Não Esquecer Nada

É preciso não esquecer nada:
nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes
nem a oração de cada instante.

É preciso não esquecer de ver a nova borboleta
nem o céu de sempre.

O que é preciso é esquecer o nosso rosto,
o nosso nome, o som da nossa voz, o ritmo do nosso pulso.

O que é preciso esquecer é o dia carregado de atos,
a idéia de recompensa e de glória.

O que é preciso é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos severos conosco,
pois o resto não nos pertence.

(Cecília Meireles)

8 de mai. de 2009

Das reclamações


Tenho sentido frio. Muito frio. E tenho perdido a paciência por pouco. Tenho dormido mal.
Estou cansada, tanto. A ponto de não ter prazer em quase nada.

Baby! I'm so alone Vamos pra Babylon! Viver a pão-de-ló E möet chandon Vamos pra Babylon! Vamos pra Babylon!... Gozar! Sem se preocupar com amanhã Vamos pra Babylon Baby! Baby! Babylon!... Comprar o que houver Au revoir ralé Finesse s'il vous plait Mon dieu je t'aime glamour Manhattan by night Passear de iate Nos mares do pacífico sul... Baby! I'm alive like A Rolling Stone Vamos pra Babylon Vida é um souvenir Made in Hong Kong Vamos pra Babylon! Vamos pra Babylon!... Vem ser feliz Ao lado deste bon vivant Vamos pra Babylon Baby! Baby! Babylon!... De tudo provar Champanhe, caviar Scotch, escargot, rayban Bye, bye miserê Kaya now to me O céu seja aqui Minha religião é o prazer... Não tenho dinheiro Pra pagar a minha yoga Não tenho dinheiro Pra bancar a minha droga Eu não tenho renda Pra descolar a merenda Cansei de ser duro Vou botar minh'alma à venda... Eu não tenho grana Pra sair com o meu broto Eu não compro roupa Por isso que eu ando roto Nada vem de graça Nem o pão, nem a cachaça Quero ser o caçador Ando cansado de ser caça...




4 de mai. de 2009

Quem deixou a segurança do seu mundo por amor...



Ele, que em tão pouco tempo virou uma das razões do meu viver.
Ele, que veio me confidenciar que o verdadeiro amor existe.
Que tem olhos caídos que quando me olham me fazem estremecer inteira.
Olhos que franzem com o nariz quando ele ri.
Ele, que sempre diz que tudo vai dar certo quando o caos se aproxima e se faz de seguro pra me deixar segura.
Que me dá flores pelo menos a cada duas semanas.
Ele, que com pequenas ou grandes ações diz de muitos modos: tô do seu lado.
Tem um coração bonito estampado na testa e nos olhos.
E tem um brinde pequeno de olhos verdes que eu adoro.
Ele, o único que me ilumina.
Ele, que adoro contemplar quando está no computador ou falando no telefone.
Que cisma em competir nas artes marciais, e me deixa quase infartando de preocupação.
Ele, que deu outro sentido às noites, quando me fez sentir verdadeiramente mulher,
outro sentido à vida quando me fez acreditar que o amor era possível.
Mas o amor inteiro, feliz, satisfeito.
Não o amor que tapa buracos tentando justificar:
"ahhhhhh ele não me satisfaz aqui, mas tem aquela outra coisa que faz com que valha a pena"
Não.
É um amor real, completo, inteiro.
E por mais que nos chamem de loucos, sabemos que a realidade real é a da felicidade.
Poderia ficar aqui discursando sobre o que ele é pra mim, e falar dos defeitos toleráveis, mas tem coisas que não se define, se sente.
Nunca pensei, mas esse amor mágico, de filmes é possível.
Eu também fazia parte do time dos descrentes da felicidade e do amor,
até que ele apareceu.
E agora só conto os dias pra oficialmente tê-lo de vez na minha vida.


23 de abr. de 2009

Atitude Curupira

Há uma coisa chamada amor. Uma coisa que não por acaso rima com dor. Deveria rimar com medo. Há um amor cá dentro. Depois de muito tempo, um amor de verdade. Iluminado como uma lâmpada acessa com medo de queimar e deixar tudo escuro de novo. Mas mesmo no claro há um fantasma, ou uma idéia de fantasma, que às vezes nem é um fantasma, mas a idéia dele existir já assusta. O fantasma da idéia no escuro. Uma idéia personificada de passado. Quem disse que amar é estar acesso no claro? E eu tenho medo. Estou acessa, mas hoje deu medo da idéia da fantasma personificada de passado com olhos acessos e seios. Deu medo da idéia de futuro no escuro que mal iluminado se deixa pressentir de forma feliz. Deu medo de mim, dele, de nós, das coisas sobre as quais não temos controle e especialmente das que temos. Deu medo da tão perigosa distração, que por excesso de perfeccionismo, neurose, traumas anteriores ou puro pessimismo percebi crescer nos últimos dias. Essa maldita distração que em maiores doses significam tantas coisas, entre elas o fim do interesse e da paixão. Coisas bobas, ínfimas mas que me dão medo. Amo e tenho medo. Tenho medo e amo. Amo porque tenho medo. Tenho medo porque amo. Me entrego com o risco certo de me dilacerar. Mas se vale a pena, que seja. Quem disse que o jogo é feito o claro e que a luz da lâmpada por mais intensa que seja é suficiente pra clarear tudo? É, ninguém disse. Mas essa merda dessa racionalidade, essa desconfiança e essa sensação de não ser boa o suficiente por um triz não me deixam desligar a chave de energia. Às vezes sinto saudades de ter o pé no chão e atrás (atitude Curupira), mas penso que escolher uma coisa é abrir mão de outras. Nesse caso, de ser feliz.

15 de abr. de 2009

Da essência.

"Depois de todas as tempestades e naufrágios, o que fica de mim em mim é cada vez mais essencial e verdadeiro."

(Caio Fernando Abreu)Tamanho da fonte

10 de abr. de 2009

Do nada


Triste. Motivo? Não sei. Depois de uma noite maravilhosa, um dia triste. Eu não existo. Existem espinhas na cara, quilos sobrando e um cabelo que não ajeita. Há uma insatisfação, exceto amorosa. Ando com o coração muito contente, com a sensação de ter entregue nas mão certas. Mas o restante? Não sei. Pode ser tpm? Pode. Há em mim, algo de muito desconhecido. Este algo sou eu.

5 de abr. de 2009

Deus, tende piedade do meu coraçãozinho cafona...

Na pressão

lenine


olho na pressão, tá fervendo
olho na panela
dinamite é o feijão cozinhando
dentro do molho dela
a bruxa acendeu o fogo
se cuida, rapaziada
tem mandinga de cabôco
mandando nessas parada
garrafada de serpente
despacho de cachoeira
quanto mais o fogo sobe
mais a panela cheira
olho na pressão, tá fervendo
olho na panela
dinamite é o feijão cozinhando
dentro do molho dela
a bruxa mexeu o caldo
se liga aí, ô galera
tá pingando na mistura
saliva da besta-fera
chacina no centro-oeste
e guerrilha na fronteira
emboscada na avenida
tiro e queda na ladeira
mas feitiço é bumerangue
perseguindo a feiticeira

1 de abr. de 2009

Da paixão



"Quem vai dizer ao coração que a paixão não é loucura, mesmo que pareça insano acreditar..."
(Oswaldo Montenegro)

27 de mar. de 2009

De Nietzsche

Amanheci bem, apesar da auto-cobrança pra não perder a desconfiança e malícia, tão duramente conquistadas. Anoiteci "Nietzschiana" (sou louca por ele), com um pitada de ironia introvertida. A idéia de desilusão pra algumas pessoas é tão nata, que a abstração chamada esperança soa como um prolongamento opcional do sofrimento.
Existem coisas que só se pode conceitualizar aos 23: hoje no meio de umas compras, percebi que uma mulher, pelo menos uma kiwi, está efetivamente interessada num homem quando passa a gastar mais com roupas de baixo do que com roupas de cima. Quanto a definição de pessoas Kiwis, ainda é uma tese sendo finalizada em parceria.

"A vida vai ficando cada vez mais dura perto do topo."

"Temos a arte para não morrer da verdade."

"É pelas próprias virtudes que se é mais bem castigado."

"Um homem de génio é insuportável se, além disso, não possuir pelo menos duas outras qualidades: gratidão e asseio."

"É necessário ter o caos cá dentro para gerar uma estrela."

"Só se pode alcançar um grande êxito quando nos mantemos fiéis a nós mesmos."

"Querer a verdade é confessar-se incapaz de a criar."

"A mulher aprende a odiar na medida em que desaprende - de encantar."

"Até Deus tem um inferno: é o seu amor pelos homens."

"Odeio as almas estreitas, sem bálsamo e sem veneno, feitas sem nada de bondade e sem nada de maldade."

"Odeio quem me rouba a solidão, sem em troca me oferecer verdadeiramente companhia."

(Nietzsche)

26 de mar. de 2009

Das rosas...


Numa metáfora espantada construída de sentimentos saborosos, posso dizer que as rosas não falam, simplesmente as rosas exalam o que muitas vezes os olhos não são capazes de ver. Uma pequena decepção com um amigo do coração ou um ex-amigo do coração. Dia saboroso, regado a rosas e com quem eu queria estar perto.

Mais um ano na estrada percorrida

Vem, como o astro matinal, que a adora
Molhar de puras lágrimas de aurora
A morna rosa escura e apetecida.

E da fragrante tepidez sonora
No recesso, como ávida ferida
Guardar o plasma múltiplo da vida
Que a faz materna e plácida, e agora

Rosa geral de sonho e plenitude
Transforma em novas rosas de beleza
Em novas rosas de carnal virtude

Para que o sonho viva da certeza
Para que o tempo da paixão não mude
Para que se una o verbo à natureza.

Soneto da Rosa - Vinícius de Moraes


23 de mar. de 2009

Das reuniões...


Pode parecer redundante, mas às vezes as reuniões acabam por reunir às pessoas...
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Quando piso em flores Flores de todas as cores
Vermelho sangue,verde-oliva,azul colonial
Me dá vontade de voar sobre o planeta
Sem ter medo da careta
Na cara do temporal
Desembainho a minha espada cintilante
Cravejada de brilhantes
Peixe-espada vou pro mar
O amor me veste com o terno da beleza
E o saloon da natureza
Abre as portas preu dançar

(Boi de Haxixe - Zeca Baleiro)


22 de mar. de 2009

Do futuro...

Ela tinha 6 anos e estava sentada nos degraus da varanda de uma casa verde quando constatou que podia ler através das estrelas o futuro que não existia. Durante muitas noites, inclinava seu pescoço curto, gordinho e branco para se entregar ao dom, que perdeu quando adulta, de apenas apreciar. Inclinava de tal forma, que sem perceber se deitava no piso vermelho fosco gelado. Foi ali que se tornou sentimental. Sua mãe certamente não devia imaginar as consequências, se não a teria impedido. Numa dessas sessões noturnas de contemplação do céu com seus enfeites de lua e estrelas - fascínio este, que carregou até os últimos dias de sua velhice, quando os contemplou pela última vez dos degraus imaginários de sua janela aos 90 anos - a menina, olhou para os seus pezinhos, examinou primeiro um, depois o outro. Contou os dedinhos com as unhas pintadas de vermelho do pé direito, depois contou os dedinhos com as unhas pintadas de vermelho do pé esquerdo, e viu, de um jeito simples, objetivo e indolor, como só as crianças vêem, que tudo nela era repetição. Os pés tinham os mesmo números de dedos que os pés da mãe e do pai e da tia e da avó e do irmão. Mas eram diferentes dos do cachorro. A menina não entendeu o porquê, afinal o cachorro era tão recheado de humanidade pra ela quanto os outros que moravam na casa. Algumas noites depois choveu. Ela não pode sentar nos degraus porquê não haviam nem lua e nem estrelas. E estava molhado. E não podia.
No dia seguinte, a chuva tinha ido passear com sua prima trovoada talvez nos Estados Unidos. Ela sentou, dessa vez no degrau mais embaixo, porque dava pra ver melhor. Inclinou o pescocinho, reparou que algumas estrelas mudaram de lugar. Até hoje lembro bem do espanto dela, quando aos 17 descobriu que o brilho de uma estrela demora até 8 anos para chegar na Terra, e que muitas estrelas que vemos podem nem existir mais. Reparou que algumas estrelas haviam mudado de lugar. E diferentemente de um pensamento de criança, que talvez imaginaria que elas estariam de mudança ou brincando de pique-pega, a menina na sua infinita e sentimental infância, entendeu que, apenas com uma ou outra mudança, todas as noites eram feitas pelo mesmo céu que estava lá, as mesmas estrelas, quase a mesma cor, e a mesma menina, com os mesmo dedos dos pés, e o mesmo assoalho, e os mesmo degraus, e era sempre o mesmo... toda ela repetição... o mesmo céu... que sempre estava lá... e sempre esteve, e sempre estará... e a mesma menina... o mesmo pescoço... com os mesmos olhos e dedos... e sempre o que era... sempre o mesmo que será... e as mesmas estrelas... que sempre estiveram... e sempre estarão. Mudem os olhos da menina, ou a cor dos degraus, o mesmo céu. O mesmo céu. O mesmo céu. Mesmo quando ela virar estrela. O mesmo céu. E o cachoro morrer. O mesmo céu. E o degrau rachar. O mesmo céu. E a vida correr. O mesmo céu. Quando o futuro chegar. O mesmo céu.

15 de mar. de 2009

Das palavras


Tenho andado com um sorriso tão cínico na cara, que quem me olha nem desconfia que ando realmente feliz...


e pouco a pouco as palavras roçavam minha pele
e eu consentia
e começaram a me apertar
até eu quase sufucar
comecei a me cansar
mas elas não me perdoaram
me englobaram
me estreitavam
numa dimensão que eu não conhecia
e sem querer me cortaram
e no lugar de sangue
brotou agonia.
(Dani Zamô)

12 de mar. de 2009

Da força...

Preciso dizer isso. É como um desabafo, não, na verdade uma espécie de auto-afirmação com uma pitada de orgulho. Não, não... confesso, é um sensação que tem em sua minoria orgulho, e em sua maioria desconforto. Isso! É um desabafo orgulhoso de uma sensação de desconforto.
Essa história de ser mais madura do que a minha idade, de ser independente em excesso, de ter muita energia e força pra dar conta de muitas responsabilidades pra minha idade... essa coisa toda ouço desde que me entendo como ser humano semi-autônomo. Mas confesso que é meio incômodo. Querendo ou não, sem um pingo de superioridade, afirmo com muita propriedade que a maioria das pessoas não são assim. Logo, quando sentem que você tem um pouco mais de iniciativa e disposição se acomodam além da conta. Eu queria entender que bosta de comodismo é esse que traga algumas pessoas. Principalmente quando se trabalha com arte... Queria sinceramente saber como essas pessoas não enxergam, ou ao menos não pressentem que poderiam ir muito mais longe se ousassem colocar os pés fora do seu limite de entendimento, o que elas na sua frágil ingenuidade denominam: segurança. Ousar faz parte, é benéfico e alimenta. É muito fácil não temer e arriscar dentro das fronteiras do óbvio. Sair disso e se expor pra suas próprias fraquezas é outra conversa...
O combinado é: vamos trabalhar. Com quê? Teatro. Ok, então vamos? Vamos. E ficam sentados esperando que o grande exemplo de força, personificado em Daniele Zamorano se manifeste! Ah pelo amor de Deus! Não sou tão grande coisa assim pra ter essa aclamação e gerar esse espanto todo. Acho que a diferença entre quem faz acontecer e quem fica esperando que façam acontecer é a tolerância ao "pode ser", "deixa rolar", "maybe...", "quem sabe". É como tolerância à dor, uns tem mais outros menos. Minha tolerância pra esperar que façam por mim é menos 57. E sinceramente acho que, a tolerância a esse tipo de coisa das pessoas de forma geral poderia ser um pouco menor. Ousar não dói. Às vezes dói. Mas é uma dor muito mais útil e interessante do que um suspiro de repouso constante. Eu ao menos prefiro. O dia que mudar de idéia, vou pra minha casinha no campo.
Tô querendo me aposentar. Se não fosse essa fome louca de aplausos, de olhos de platéia, de catarse, de divisão do que é humano, de pode descansar da minha insignificância como um só ser, já o tinha feito.

Alguns trechos da leitura atual (O Ovo Apunhalado - Caio Fernando Abreu):

"...mas não sou forte, apenas construí de minhas fraquezas essa coisa que talvez chamassem força."

"Porque você não pode voltar atrás no que vê. Você pode se recusar a ver, o tempo que quiser: até o fim de sua maldita vida, você pode recusar, sem necessidade de rever seus mitos ou movimentar-se de seu lugarzinho confortável. Mas a partir do momento em que você vê, mesmo involuntariamente, você está perdido: as coisas não voltarão a ser mais as mesmas e você próprio já não será o mesmo."

"O que eles deixaram foram estes três postulados: importante é a luz, mesmo quando consome; a cinza é mais digna que a matéria intacta e a salvação pertence apenas àqueles que aceitarem a loucura escorrendo em suas veias. "

8 de mar. de 2009

Do absurdo de ser real

"Estragon: - Que tal se a gente se enforcasse?
Vladimir: - É um modo de se masturbar."
(Esperando Godot - Samuel Beckett)




5 de mar. de 2009

Domino...

Formatura de uma querida amiga. Nascimento da minha sobrinha Aurora. Acontecimentos especiais, início de ciclos de, e para pessoas importantes. No fim da noite, entre outros, um susto. Uma confusão que achei que não fosse mais vivenciar. Afinal, fazem anos. Um esboço mau humorado, grosseiro e insensível de interesse fundamentado. O vi de forma romântica... sem nenhum motivo aparente.

Domino (existem tantos segredos dentro das palavras...)

Há em você um silêncio
que me perturba,
que me fala internamente

Há no teu calar
uma ofensa ao
meu coração displicente

De que forma
resguardada você
se move até mim?

De teus olhos sei
tão pouco,
de minha miragem
timidamente vejo
tua voz me invadir.

Quem é você que tão
pausadamente se aproxima?
E como uma ameaça inocente,
o meu pensamento domina.

Há algo que estranhamente
te entrega
e me anula
e transforma em espera
o que antes não era

Linha estreita
que me tange e me capta
meu coração à espreita
do teu mistério,
que pros mares antigos de ilusão
me arrasta

E do que não domino
me afasto
como o idéia de paixão
que dentro de mim
teu silêncio resgata.
(Dani Zamorano)

3 de mar. de 2009

Das causas e consequências...

...Não posso procurar kiwis no meio de pêssegos. Certos nomes já podem ser eliminados da minha salada de frutas. Cansei de ser consequência, quero ser causa. E se eu não puder ser causa, que não percam tempo me procurando...

Abstração

Sou abstrata demais
E por bastar-me é que existo
Pois se não fosse o que sou
Jamais seria eu o que restou

E de ser incompleta
Visto-me a cada dia
e quando me olho de perto
Vejo, e me assombro
com a regalia de puramente ser
que só a mim permito

Sou própria de mim
e assim me pertenço
se sou prosa ou se sou verso,
suficientemente sou,
e assim floresço.

E a mim me encontro
e de mim me perco
quando ao que não pertence a mim
cedo.

E na abstração, que é
marca minha,
exerço minhas vontades

Pra calar o que de mim via
e a saudade que de mim me invade.
(Dani Zamorano)