10 de nov. de 2009

Do inominável


há coisas que não tem nome e nem precisam dele pra existir. puramente são e deixam de ser quando precisam deixar de existir. deixar de ser também é necessidade.



Onde agora? Quando agora? Quem agora? Sem me perguntar. Dizer eu. Sem pensar. Chamar isso de perguntas, de hipóteses. Ir em frente, chamar isso de ir, chamar isso de em frente. É possível que, um dia, o primeiro passo dado, eu simplesmente pare, ou, em vez de sair, segundo um velho hábito, passar dia e noite o mais longe possível de onde eu moro, não era longe. Isso pôde começar assim. Não mais me colocarei questões. Acredita-se apenas repousar, a fim de agir melhor em seguida, ou sem pensamentos rasteiros, e eis que em muito pouco tempo se pega na impossibilidade de jamais voltar a fazer coisa alguma. Pouco importa como isso se dá. Isso, dizer isso, sem saber o quê. Talvez eu não tenha feito senão inteirar um velho estado das coisas. Mas eu não fiz nada. Ostento ares de falar, não sou eu, de mim, não é de mim. Algumas dessas generalizações para começar. Como fazer, como eu vou fazer, o que eu vou fazer, na situação em que me encontro, como proceder? Por pura aporia ou melhor por afirmações e negações anuladas a torto e a direito, ou cedo ou tarde. Isso de modo geral. Deve haver outros vieses. Senão seria de se desesperar de todo. Mas é de se desesperar de todo. A reparar, antes de ir mais longe, em frente, que digo aporia sem saber o que isto quer dizer. É possível ser efético de modo que não à revelia? Eu não sei. Os sins e nãos, é outra coisa, eles me retornarão à medida que eu progredir, e o modo discreto de tirar do sério, cedo ou tarde, como um pássaro, sem esquecer um só. Diz-se isto. O fato parece ser, se na situação em que me encontro posso falar de fatos, não somente que eu vou ter de falar de coisas de que eu não posso falar, mas ainda, o que é mais interessante, que eu, eu não sei mais, não dá em nada. Não obstante, sou obrigado a falar. Não me calarei jamais. Jamais. (Beckett - O Inominável)